7 de janeiro de 2012

Paul Larivaille - A Itália no tempo de Maquiavel


LARIVAILLE, Paul. A Itália no tempo de Maquiavel: Florença e Roma. São Paulo: Companhia das Letras, 1988.

O Renascimento italiano é um tema singular que instiga a curiosidade de muitos, e já foi objeto de estudo de alguns historiadores de renome. Ainda no século XIX, Jacob Burkhardt dedicara um livro ao período na Itália, que veio a ser tornar referência no assunto. Já no século XX, o tema foi tratado à exaustão, e a questão a respeito do recorte geográfico desse dito “renascimento” transpassar ou não as fronteiras dos estados que viriam a formar o que conhecemos hoje por Itália, no século XIX permaneceu. O inglês Peter Burke é outro exemplo de historiador renomado que aborda o tema, tecendo, inclusive, críticas a Burkhardt por conta deste último defender a idéia de um Renascimento localizado – na Itália, como pode-se supor.

A presente obra analisada de autoria de Paul Larivaille, especialista no Renascimento italiano, faz parte de uma coleção intitulada A vida cotidiana, que possui outros livros de grande qualidade, como No tempo dos cavaleiros da Távola Redonda, de Michel Pastoreau e O Faroeste, de Claude Fohlen. Como o título da coleção dá a entender, a obra não se limita a discutir apenas os pontos mais previsíveis do período trabalhado – aproximadamente entre 1420 e 1530 –, como as relações de poder entre as famílias, o papado ou as artes, mas também problematiza as camadas mais pobres e sua participação nessa vida cotidiana, que não pertenceu apenas aos palácios dos príncipes.

Apesar de tal proposição abrangente, era de se esperar que, também por uma questão de facilidade com relação ao acesso às fontes, a obra reservasse grande espaço aos temas mais previsíveis apontados acima. Ganham destaque os diversos jogos de política da Itália do século XV; em vários capítulos a família Médici, principalmente Lourenço, o Magnífico, além da Igreja – principalmente durante o pontificado de Rodrigo Borgia, então Alexandre VI – têm grande destaque na narrativa. A corrupção, não apenas durante o período em que Alexandre VI fora papa, mas também o período anterior e posterior ao seu comando da Igreja, ganha um capítulo próprio, inclusive fazendo alguma relação com a vindoura reforma.

Larivaille não se esquece do importante papel dos mercadores e banqueiros, aos quais um capítulo também é dedicado, assim como aos artistas. Maquiavel, cujo nome estampa o título da obra, também tem um capítulo dedicado a si, que pretende discutir não apenas o senso comum a respeito do personagem, mas também se dedica a discutir o papel do intelectual no contexto que o livro trabalha.

Os últimos dois capítulos, acrescidos da conclusão, voltam seu foco para as classes subalternas, trabalhando a relação entre a plebe e a nobreza, o campo e a cidade, e a discussão a respeito do que é mito e o que é realidade na condição do camponês. Trata, também, do papel dos indivíduos da família na sociedade, e sabiamente desmistifica os ideais de pais de família, mulheres e etc, baseados em documentos mais voltados para deleite de famílias abastadas do que compromissados com a realidade cotidiana, principalmente das classes menos favorecidas socialmente.

Em suma, a obra de Paul Larivaille mostra uma Itália paradoxal; ao mesmo tempo em que mostra a fragilidade das estruturas políticas e militares diante da intervenção de grandes nações vizinhas e à mercê das mesmas, mostra como banqueiros e comerciantes eram proeminentes no comércio europeu, e como, à sua maneira, os estados triunfaram sobre as ameaças externas no desenvolvimento das artes e das letras, que reforçavam uma suposta superioridade local, em contraste com o barbarismo e grosseria dos estrangeiros Um contexto onde a subjugação militar não ultrapassa os limites da cultura e da economia, sendo tanto a primeira quanto a segunda formas de resistência e unidade diante da ameaça externa.

Um livro que não se perde nem em bajulação, nem em detração gratuitas ou exageradas, A Itália no tempo de Maquiavel é uma leitura obrigatória para qualquer historiador que anseie entender melhor a sociedade onde o “Renascimento” tomou forma. Para leitores casuais, o livro pode ser de difícil digestão em sua totalidade, mas a variedade de temas e capítulos fornece uma ampla gama de leituras localizadas que podem despertar interesse.

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